Democracia na internet



Por Manuela D'Ávila*

A internet revolucionou o acesso às informações e à cultura. Hoje temos ao alcance dos dedos quase todo o conhecimento produzido pela humanidade. Além disso, o contato ultrapassou a barreira da distância, permitindo conhecermos e nos relacionarmos com pessoas a milhares de quilômetros. E mesmo a forma de vermos TV, ouvirmos músicas e acessarmos nossas contas bancárias mudou radicalmente depois da internet.

Aos poucos, nossa legislação está se adaptando a estes novos tempos. Mas está em debate na Câmara um projeto que pode atingir um valor caro para nossa democracia: a liberdade de expressão.

Aprovado pelo Senado em 2008, o projeto de lei sobre crimes digitais no Brasil cria uma série de normas e procedimentos para combater os crimes na internet. Mas, muito longe de seu objetivo original, o projeto poderá transformar provedores de acesso em centros de espionagem e delação. O projeto inviabiliza, por exemplo, a rede wi-fi pública que existe no Parque da Redenção, bem como as redes wi-fi abertas que existem nos shoppings.

Além disso, ele desobriga o sistema bancário de proteger seus clientes, invertendo a lógica e responsabilizando os clientes pelos desfalques que eles podem sofrer. Mas o projeto vai além: se aprovado, os usuários podem ser criminalizados pelo download de arquivos e músicas.

O projeto é alvo de um abaixo-assinado virtual com quase 150 mil assinaturas, disponível na internet.

A reação ao projeto, apelidado de “AI-5 Digital”, cresce a cada dia.

A inspiração deste projeto é a Convenção de Cybercrimes, assinada, em 2001, em Budapeste, na Hungria. Montada pelos lobbies de fabricantes de softwares e de direitos autorais da Europa, a convenção não foi assinada pelo Brasil e por nenhum país latino-americano. Nem pela maioria das grandes nações em desenvolvimento, como China e Índia.

Em busca de apoio, os defensores do AI-5 Digital afirmam que a lei vai reforçar o combate ao abuso sexual de menores. Mas já há legislação específica sancionada em novembro de 2008 que aumenta a pena máxima de crimes de pornografia infantil na internet de seis para oito anos de cadeia, além de estabelecer punições mais rígidas para a aquisição, posse e divulgação de material pornográfico.

Não se trata, portanto, de um projeto que irá proteger as conquistas que tivemos com a popularização da internet. O projeto do senador Azeredo, se aprovado, em nada afetará a vida dos cibercriminosos, mas afetará em muito a vida dos demais cidadãos.

Ou falamos agora, ou corremos o risco de, na internet, nos calarem como na época do AI-5.



Manuela Pinto Vieira d'Ávila é uma jornalista e política brasileira. Começou sua carreira no movimento estudantil, foi vice presidente da UNE no Rio Grande do Sul e depois ingressou na política partidária pelo PCdoB. Atualmente é deputada federal.

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